Seja estrela


Era sexta e eu voltava no engarrafamento de sempre. Ônibus e carros iam numa velocidade quase desprezível e podia-se observar cada detalhe daquela cidade em movimento.
O carona do carro ao lado ia lendo um livro e nem dava atenção ao motorista que demonstrava querer estar numa conversa para distrair o cansaço, enquanto as motocicletas iam tentando desviar do trânsito caótico como formigas numa caminhada rápida em busca do formigueiro. Todos estranhos aos olhos mas com um único objetivo em comum: chegar ao seu destino independente do que havia ao redor.
Um dos ônibus me chamou a atenção. Sem nada pra fazer, contei as janelas, li a numeração e essas coisas que a gente faz na busca por uma distração... Tentei contar as pessoas, mas eram muitas. Alguns jovens aparentemente cansados demonstravam estar vindo de seus respectivos locais de estudos; um casal de idosos devia estar à passeio, a moça grávida com um sorriso estampado trazia à mão algo parecido com um ultra-som e deixava claro para quem quisesse a alegria que estava sentindo, ao contrário de um homem muito bem vestido, que cochilava como se não fizesse aquilo há anos. Algumas das demais também dormiam, outras conversavam, mexiam no celular ou simplesmente olhavam pro nada  numa conversa incansável com elas mesmas. E quase todas assim, sozinhas.
Um significado pra eu ter reparado em todas estas pessoas? Acho que não. Só não é imperceptível pra quem tem um pouco de sensibilidade que estão todos tão perto e ao mesmo tempo tão distantes, com tantas histórias para serem compartilhadas e nem um "boa noite" às vezes se é dado. Tem muita gente feliz por aí, mas tem muita gente precisando de um sorriso, copo d'água ou aperto de mão também. 
Às vezes quem mais necessita nem é quem está ao nosso lado no ônibus, mas é o nosso vizinho que está todo dia em pé no portão, pode ser aquela família que perdeu quase tudo numa enchente do verão ou aquele senhor que vive sentado perto do mercado mesmo em dias ensolarados. E o que tem isso? É bem provável que em um dia quente você tenha parado no portão mas não perguntou se na casa do seu vizinho caiu água hoje, ou que nunca tenha notado que aquele casaco guardado no armário possa esquentar alguém que precise e que aquelas moedinhas de R$1 no seu bolo possa matar a sede de alguém...
Somos a geração do fone de ouvido e felizes são os que vão além das barreiras que isso faz entre nós e o mundo. Felizes são àqueles que reparam em muito mais do que nas estrelas de uma noite quente, mas que  fazem questão de ser um brilho a mais para quem está debaixo desse imenso céu azul. 




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