Ela é seu grande amor

Ela está solteira e não é dessas que se importa de estar sozinha. Se olha no espelho e pensa em mil cortes de cabelo, mesmo que não vá executar nenhum. Todo dia acorda e pensa: "hoje eu vou pintar as unhas de amarelo", mas aí vem a preguiça e ela deixa pra outro dia, e acaba que pinta de vermelho. Ela é um pouco esquisita e tem dias que acorda rindo de qualquer motivo. É na dela também, mas sabe levar tudo com bom humor. Não foge de assuntos, mas odeia perguntas sobre o porquê de não estar namorando.

Tem vestidos soltinhos e não gosta do inverno. Prefere roupas floridas e gosta de andar de chinelo. Clichê, pra ela, é só tomar chá em tempo frio. Ela toma refrigerante em xícara, bebe café em taças, come pizza só no guardanapo, gosta de acampar e é feliz por ser quem sempre deseja. Tudo assim, sem frescura.

Tem dias que ela brilha mais do que o sol. Ri das bobeiras alheias, brinca na lama com seu sobrinho mas também se derrete com um sms carinhoso que chegou durante a madrugada e com ligações que expressam saudade.

Não tem o sorriso certo, mas não quer usar aparelho. É cheinha, mas não quer fazer dieta. E daí que tem aqueles pneuzinhos quando senta? De perfeita ela só tem aquela Barbie guardada na prateleira desde quando tinha sete anos. Acorda, toma chocolate quente, coloca uma roupa e vai pra faculdade. Assim, com uma única maquiagem todos os dias, que é o sorriso de quem está de bem com a vida.

Nos dias de chuva interior, ela tira o salto do armário. Não, não vai sair pra badalar. Vai apenas se arrumar, olhar no espelho e trazer a memória o quando ela é linda.

E é realmente linda e adora uma conversa. Fala do tempo, da novela, da mãe, da faculdade, de sonhos, de problemas nacionais, menos de futebol... Não é por não gostar, é por não entender mesmo. Quando querem conversar, ela fala menos do que escuta. E como sabe escutar. Escuta com os olhos, com as mãos, com os ouvidos e com o coração. Está sempre pronta a doar-se de corpo inteiro para ajudar a quem ama.

Ela curte Nickelback, Paralamas e Leoni. Não tem um tom de voz dos melhores, mas talvez seja aquela doçura que encanta a todos. Lê Martha Medeiros e Gabito, seus preferidos. Mas diz que gosta mesmo é dos textos de um antigo amorzinho.

Tem manias estranhas, admito. Liga o ar porque gosta de sentir frio e dorme feito um esquimó enrolada no edredom. E fica linda assim, inclusive quando acorda antes do despertador e faz aquela cara de quem teve uma noite de sono gostosíssima. Não larga aquele celular, são milhares de mensagens por dia e inúmeras ligações. E quando ele descarrega? Ela anda com o carregador na bolsa. Mas, espera aí... Bolsa? Que bolsa? Ela odeia bolsas. Prefere uma mochilinha ou outra e pouco se importa se não combina com o visual.

Gosta de dançar, apesar de não ser das melhores. Coloque uma música e veja alguém que é capaz de se divertir mesmo sem ninguém por perto. Recusa convites perto de prova, mas adora ser convidada. Ama batons fortes e odeia sombras escuras, gosta de brincos grandes mas nem pense em pedir pra se maquiar todos os dias.

E ela ainda está lá, sem um par. É praia, amigos, família e diversão. Mas tudo sem um grande amor. Eu fico aqui, do outro lado, sempre a observando. Vou nos mesmos lugares e raramente me aproximo. Aqueles olhos redondos castanhos brilham e repousam sobre mim junto com um pequeno sorriso que sai da boca desenhada e percebo que a resposta é sempre a mesma. Ela muda o tom da fala e me responde que está assim porque quer, porque pra estar com ela tem que ser pássaro pra voar junto. Ela é dessas, que vive bem com ela mesma e talvez seja assim que um outro alguém deve se aproximar.

Talvez sejam essas manias matemáticas, que sempre a fazem querer somar e nunca subtrair. Tudo que ela quer mesmo, é multiplicar a felicidade. Mas é aí que meu silêncio se instala e solto um riso sem graça assim que lembro que ela é exceção... E fico querendo saber de onde tiro essa ideia louca de que todo mundo tem sempre que ter alguém pra dormir junto no sábado à noite.